Tuesday, January 17, 2023

Os louros do filme Ecos da Cidade dos Mortos

É com enorme satisfação que soube, juntamente com toda a equipa de produção do filme "Ecos da Cidade dos Mortos", a selecção oficial em dois festivais após a estreia em 2022, um deles nos EUA. O filme realizado por Raul Losada e produzido por ERA Arqueologia tem tido muito boa aceitação e conta com selecção oficial para mais três festivais em 2023, no Golden Giraffe International Film FestivalFirenze Archeofilm e The Archaeology Channel International Film Festival, em França, Itália e EUA respectivamente.

Em finais de 2022 e já este ano, soubemos que fomos vencedores em dois festivais, no LISBIFF Lisboa Indie Film Festival e vencedor na categoria de melhor filme histórico no renomado Golden Giraffe International Film Festival. Neste sentido, a lista de aparições em festivais e certames tem vindo a aumentar progressivamente, com novas selecções para 2023. Até agora, a lista de selecções oficiais em festivais são as seguintes:

- Arkhaios Film Festival, 2022, EUA.

- LISBIFF Lisboa Indie Film Festival, 2022 (vencedor melhor médio-metragem).

- Golden Giraffe International Film Festival, 2023, França (vencedor melhor filme histórico)

- Firenze Archeofilm, 2023, Itália.

- The Archaeology Channel International Film Festival, 2023, EUA.
























Na categoria de produtor de conteúdos multimédia para audiovisual, área que me apaixonou desde sempre, ter a oportunidade de colaborar na realização de um filme histórico é uma tarefa tão extenuante quando apaixonante. Recordo quando em 2004 me desloquei a Roma para tentar estabelecer colaboração com Aldo Claudio Zappalà, director executivo e artístico da Village doc&films-Roma, no sentido de produzir conteúdos de reconstituição arqueológica para documentários de televisão. Naquela data a oportunidade não surgiu e nunca esperei que um dia pudesse desempenhar essa função no meu país. Na verdade é a realização de um sonho!

A minha participação neste filme permitiu-me reconstituir a antiga grande necrópole romana da Praça da Figueira, em Lisboa. Este exaustivo trabalho contou com a inestimável consultadoria científica de Rodrigo Banha da Silva, arqueólogo que escavou a necrópole nos anos 90 do séc. XX. A virtualização da necrópole em 3D pode ser vista em pequenos planos de vídeo com animação de personagens e sonoplastia.


Trailer Oficial "Ecos da Cidade dos Mortos, a grande necrópole de Olisipo" from Raul Losada on Vimeo.

Friday, December 30, 2022

Sarcófago da caça aos javalis e veados

O sarcófago da caça aos javalis e veados é o último dos três modelos fotogramétricos que realizei em França este mês de Dezembro. Trata-se de um relevo esculpido em mármore de Carrara (Itália), datado de meados do século IV d.C. O relevo pertencia a um sarcófago, conservando-se apenas o friso esculpido da caixa. O fragmento faz parte da exposição permanente do Musée Départemental Arles Antique e encontra-se exposto numa das paredes, estando enquadrado por uma espécie de rebordo que lhe serve de moldura.

A "moldura" saliente da parede impossibilita que se consiga fazer o registo fotográfico dos lados do sarcófago. A iluminação inadequada para a prática da fotogrametria também não ajudou a registar os topos laterais do relevo esculpido. De qualquer maneira, tendo em conta as condições nas quais a peça foi fotografada, o modelo 3D está bastante aceitável.

O fragmento de sarcófago ilustra uma cena de caça aos javalis e veados, cujo tema é recorrente na arte funerária, quer por se tratar de um dos passatempos favoritos do defunto ou, por um conjunto de motivos de ordem simbólica associados à luta na vida terrena com o fim de alcançar a salvação.

As cenas alusivas à caça desenvolvem-se sequencialmente da direita para a esquerda, separadas por árvores estilizadas sugerindo a floresta, local onde decorre a acção.

No início, uma figura a pé empunha uma espada ao mesmo tempo que incentiva ao ataque dos cães a um javali. Ao centro, os caçadores forçam os veados na direcção de uma rede enquanto uma lebre consegue escapar à armadilha. Estes caçadores usam túnicas curtas, calçam botas e têm as pernas protegidas. Os caçadores que seguram a rede estão descalços e desprotegidos, o que nos permite supor tratar-se de escravos. Outras figuras ostentam o manto chamado paenula, enquanto outros usam o cucullus, uma espécie de capa que cobria a cabeça.


Thursday, December 22, 2022

O homem togado do museu de Nîmes

No seguimento do modelo fotogramétrico do relevo do museu de Nîmes, a aproveitei a ocasião para registar uma escultura no mesmo museu, cuja posição da peça na exposição seria perfeita se não fosse o problema das luzes e a altura, tendo-me impedido de registar eficazmente a parte superior da cabeça.

Trata-se de uma escultura de um homem togado em mármore branco com veios de cinza, datada dos sécs. I-II d.C.

Uma das janelas do museu encontrava-se precisamente por detrás da escultura, tendo impossibilitado obter uma luz homogénea. Por outro lado, os focos de luz que iluminam a exposição criam a um jogo de luzes muito pouco adequado para a prática da fotogrametria. Trata-se no entanto de um modelo 3D razoavelmente bem conseguido, não fosse o defeito na parte superior da cabeça. Infelizmente não posso carregar um escadote para o interior do museu!


Tuesday, December 20, 2022

Um relevo romano em mármore

Em Dezembro deste ano realizei uma viagem de estudo há muito desejada por mim, à antiga província romana da Gália Narbonense. Entre os locais que queria muito visitar estavam as cidades de Nîmes, Arles e Orange, com toda a sua herança romana, entre outros locais que considero imperdíveis, tal como a Pont du Gard.

Aproveitei esta deslocação para realizar alguns levantamentos fotogramétricos. Não estava nada definido e a oportunidade surgiu da ocasião. O fantástico "Museu da Romanidade" de Nîmes (Musée de la Romanité) ostenta uma incrível colecção permanente de centenas de peças de grande valor artístico e histórico-cultural. Uma das peças que me saltou à vista e que me permitia fazer um levantamento fotogramétrico foi um lindo relevo de época romana esculpido em mármore, decorado com volutas de folhas de acanto e povoado com pássaros.

O modelo fotogramétrico foi obtido com 36 fotografias (sem flash conforme as regras do museu). As condições para fotografar não foram as melhores, uma vez que a iluminação não era adequada e a peça encontrava-se semi-embutida na parede, tornando impossível obter uma leitura perfeita da faces laterais e do topo. Ainda assim, o registo do relevo ficou aceitável.


Friday, December 16, 2022

Uma rua romana no Monte dos Castelinhos - Sondagem 8

A Sondagem 8 das escavações do Monte dos Castelinhos trouxe à luz do dia vestígios importantes para o conhecimento do urbanismo romano daquele sítio.

João Pimenta, arqueólogo responsável pela escavação faz uma abordagem à Sondagem 8 neste seu recente artigo.

Trata-se de uma secção de uma via de circulação ladeada por construções em ambos os lados. Foi ainda identificada uma possível segunda via, perpendicular à via principal, podendo indiciar uma certa regularidade urbanística.


Planta em 3D com reconstituição das estruturas correspondentes à Fase 3.


Com uma pendente considerável, as estruturas identificadas na Sondagem 8 caracterizam-se por uma adaptação ao terreno através do escalonamento dos vários ambientes dispostos em patamares, em certos casos interligados por degraus.


Vista axonométrica do conjunto arquitectónico da Sondagem 8, correspondente à Fase 3.


O sítio, ocupado desde o período republicano, foi alvo de uma reforma urbanística no período augustano, nos inícios do século I da nossa era, tendo dado toda uma nova configuração a este local. A estrutura mais significativa em termos arquitectónicos foi a construção de um pórtico, elemento que contribuiu para uma nova configuração arquitectónica, deixando perceber que podermos estar perante uma mudança de paradigma no urbanismo e arquitectura do Monte dos Castelinhos.


Reconstituição parcial do conjunto arquitectónico da Sondagem 8, correspondente à Fase 3.


A complexidade do processo reconstrutivo deve-se sobretudo à falta de leitura integral do conjunto escavado com a continuidade das estruturas ainda por descobrir. Por isso mesmo, limitamo-nos a reconstruir os muros até meia altura de forma a deixar perceber a forma e a natureza das estruturas arqueológicas identificadas, enquanto que do lado oposto se optou por reconstituir o alçado que terá existido. É uma proposta possível.


Reconstituição parcial do conjunto arquitectónico da Sondagem 8, correspondente à Fase 3.


De difícil articulação é o pórtico identificado, cuja pendente da rua permite-nos perceber um engenhoso sistema dos telhados. Pareceu-nos lógica e funcional a solução de telhados escalonados que acompanham o declive to terreno.


Vista axonométrica do conjunto arquitectónico da Sondagem 8, correspondente à Fase 3.


Como conclusão, podemos dizer que este troço de rua permite supor, ainda que de forma preliminar, haver preocupação por uma regularidade urbanística, quer através da monumentalização ocorrida no século I da nossa era, quem pela presença de uma rua secundária perpendicular. Por outro lado, é evidente a preocupação que os construtores tiveram na adaptação da construção à inclinação do terreno, arranjando forma de os ambientes se conectarem por meio de degraus.

Friday, November 18, 2022

Série fotográfica de Pompeia #4

Está disponível a 4ª e última entrega das fotografias sombre Pompeios que realizei na minha visita do verão passado. Espero poder voltar lá em breve para produzir novas fotografias e analisar mais detalhadamente aquele sítio maravilhoso.

Esta última entrega de fotografias contém 3 imagens, uma do Templo de Apolo, outra sobre o Odeon e uma outra do altar do Templo do Génio de Augusto, no fórum.

As fotografias estarão disponíveis para download em alta-resolução durante algum tempo para poderem ser reproduzidas unicamente para fins pessoais, para decorarem as vossas casas ou escritórios aqui.

Os direitos de autor para uso e partilha deste trabalho estão baseados na Creative Commons 4.0

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Thursday, November 17, 2022

Esquema construtivo da casa da Sondagem 4 do Monte dos Castelinhos

Quando pensamos em arquitectura romana nem sempre temos a consciência de que muitas vezes se estrutura com base numa métrica e modulação bem definidas. Pelo menos isto não nos é patente numa primeira observação, especialmente quando os vestígios se encontram mal conservados e não se erguem em altura.

É o caso da casa identificada na Sondagem 4 no Monte dos Castelinhos. Construção que segundo João Pimenta identifica como uma construção de tipologia das "casas dos tribunos". Podem saber mais sobre este assunto consultando a tese de Doutoramento de João Pimenta aqui.


Proposta de reconstituição 3D da casa identificada na Sondagem 4.














Voltando à casa da sondagem 4, a ruína encontra-se praticamente à altura dos alicerces e a percepção que conseguimos ter das estruturas é em certa medida um pouco vaga. No entanto, com um olhar atento e um levantamento das estruturas torna-se clara a regularidade da construção. Trata-se de uma construção de planta quadrada, com as divisões bem compartimentadas, permitindo-nos perceber que se estruturava em torno de pátio central.


Planta em 3D com reconstituição da Sondagem 4.




















Os ligeiros desvios no quadrado que forma a planta devem-se sobretudo à irregularidade do terreno. Composto por uma pendente acentuada, fez com que a construção se alongasse no sentido Oeste, tento resultado num losango disfarçado. A forma quadrangular da planta é a que mais sobressai numa primeira observação.

Tornando à questão inicial sobre a modulação da construção, constatamos que a casa da Sondagem 4 apresentava um esquema regular que podia ocultar uma métrica bem definida. Em primeiro lugar, a identificação do pé osco-itálico de 275mm por João Pimenta foi fundamental para se conseguir ensaiar uma grelha construtiva que se baseasse nesta unidade de medida praticada ainda numa fase tardia da república romana.


Análise do módulo construtivo da casa da Sondagem 4.




















Quando foi sobreposta à planta uma grelha regular de 5 pés (1 passus), constatamos que a construção se inseria num módulo de 13 passus, o equivalente a 65 pés. Foi ainda evidente que quase todos os muros da construção se orientavam pela grelha que lhe havia sido sobreposta. Neste sentido, pareceu-nos evidente tratar-se de uma construção que assentou num projecto conceptualmente bem definido, cujos muros se estruturam em espaços definidos por proporções concretas e não aleatórias.


Análise do projecto. A verde, alinhamentos coincidentes com a grelha/módulo construtivo, a roxo, hipótese de alinhamentos conforme o projecto original.




















A ideia que nos ressalta é que esta construção, assim como outras de época romana, foi desenhada a partir de uma grelha/módulo que permitia ao arquitecto ou mestre de obras definir a planta, orientando os muros a partir da grelha construtiva que lhe serviu de base. É curioso ainda darmo-nos conta que alguns muros se alinham correctamente pela grelha construtiva, mas outros, orientam-se pela grelha por uma das faces, interna ou externa. Este é um aspecto que observamos em muitas construções romanas de carácter civil.

Outro aspecto curioso tem que ver com as proporções alcançadas por esta grelha/módulo. Se até aqui constatamos que há uma clara evidência dos alinhamentos se estruturarem a partir da grelha construtiva, também não deixa de ser interessante verificar que os compartimentos da construção respeitam na sua grande parte determinadas proporções muito comuns na antiguidade.


Análise das proporções patentes nos diferentes Ambientes da casa da Sondagem 4.




















Verificamos então que o rectângulo 5:7, obtido a partir da raiz de 2 e o rectângulo 5:8 (muito aproximado à proporção áurea) foram os mais usados. Constatamos ainda a existência do rectângulo 5:6 que em vários Ambientes da casa se desdobra por si mesmo ou noutra proporção. A utilização do quadrado (1:1) também está patente e foi a proporção usada para o pátio central.


Análise da utilização da proporção áurea na casa da Sondagem 4.






















A proporção áurea está identificada no que respeita ao rácio entre comprimento e largura em dois Ambientes da casa, porém, podemos observar como esta proporção está bem patente em praticamente todas as divisões e sub-divisões dos espaços. Não é só a grelha/módulo que ajudou no posicionamento dos alinhamentos mas também a inter-relação que os alinhamentos mantêm entre si, combinando um conjunto de interacções baseadas na secção áurea.